Prólogo ao caderno Froles d'Ouro, música galega para guitarra composta por Manuel H. Iglesias e editada por Dos Acordes:
Desde a medieval época das Cantigas conservam-se na Galiza em iluminuras de livros, nos adornos dos templos, em talhas escultóricas, em pinturas, inúmeras representações de guitarras e outros instrumentos da mesma família que, junto com as manifestações musicais recolhidas nos cancioneiros galegos, o cultivo musical e literário dos nossos inteletuais mais capazes e a sempre forte vertente popular, fazem inacreditável não termos ainda um corpus musical definido e um conceito claro da relevância que a guitarra teve na história da música galega.
Veículo de expressão magnífico tanto nas mãos de amadores quanto de profissionais, os galegos que estudamos a guitarra com os materiais existentes nas últimas décadas do século XX aprendemos a estrangeirizar o nosso instrumento, a vê-lo como produto de outros, a estudar unicamente música não galega e a ignorar qualquer ligação que pudesse relacionar a guitarra com a nossa tradição cultural. Afortunadamente, na primeira década do século XXI tem havido já algumas iniciativas de recuperação da memória musical e dos usos populares e eruditos do nosso instrumento.
Este volume de melodias arranjadas para guitarra por Manuel Herminio Iglesias consegue mostrar-nos uma formosa parte do nosso acervo musical esquecido nos centros oficiais de ensino, ao tempo que se integra nesse nascente movimento de recuperação da guitarra como instrumento apropriado para a interpretação de música galega. Partindo da longa tradição dos instrumentos de corda pulsada que consiste em completar o repertório com arranjos da música vocal, e seguindo o ronsel que Marcial Valladares começara a abrir na Galiza do século XIX, o autor vestiu as melodias galegas com belas harmonias clássicas, acrescentando algum desenvolvimento formal próprio da música académica, com o propósito de fornecer uma via de entrada ao estudo profissional.
Obra necessária para a criação de um ensino musical baseado na nossa tradição e orientado à nossa gente, aguardo que seja continuada por outros muitos volumes e autores a dignificarem a nossa música e a proclamarem nos próximos anos o feliz renascimento da guitarra galega.
Isabel Rei Samartim